A revelação de que o governo dos EUA monitora em segredo a atividade na internet de estrangeiros evidenciou a facilidade em se obter dados pessoais deixados para trás na navegação em redes sociais, sites e páginas de pesquisa. Conteúdo para tal não falta: em 2012, segundo estudo da consultoria norte-americana Cisco, o volume de tráfego na web girava em torno de 12 mil gigabytes por segundo, quantia que deve mais do que triplicar até 2017.
“Revolução”
Coleta de informações da web é conhecida como Big Data
O fenômeno recente de monitorar e organizar a montanha de dados disponíveis na internet ganhou o apelido de Big Data. Empresas ávidas por decifrar seus clientes e hábitos de consumo tratam o tema como uma “revolução”. O hype é fomentado por empresas como o Google e a Microsoft, que já disponibilizam ferramentas capazes de auxiliar a interpretação de informações coletadas em bancos de dados públicos e por meio de pesquisas feitas nos próprios sites.
O pesquisador do Programa de Pós Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Ulbra (Porto Alegre) Renato Pires dos Santos lembra que ferramentas fornecidas pelo Google, que permitem estudos aprofundados, são parte de uma estratégia para justificar o monitoramento de dados. “Hoje, 90% do faturamento do Google vem da publicidade, que é diferenciada justamente por causa desse armazenamento de informação, o que permite um direcionamento de público muito superior. Ou seja, o Google faz algo questionável e depois divide parte dos dados para minimizar o lado ruim dessa prática”, explica.
O argumento de que a massa de dados coletados para estudos estatísticos não tem rosto e, assim, não invade a privacidade dos usuários, é colocado em xeque por pesquisas recentes. Estudo feito na Europa com 1,5 milhão de usuários de celulares mostrou que apenas quatro pontos de referência são suficientes para identificar 95% dos cidadãos – ou seja, quanto mais bancos de dados se cruzarem, maior é a chance de transformar em um rosto o que antes era apenas um número.
O que são algoritmos
São sequências de instruções usadas na programação de computadores, que descrevem o caminho a se seguir para que um sistema ou programa execute tarefas pré-determinadas. Hoje, os algoritmos são usados para decodificar e organizar a grande quantidade de dados presentes na internet e já automatizam a operação de vários sistemas, como o das bolsas de valores, justamente por serem capazes de desencadear diferentes ações conforme diferentes cenários.
Para as gigantes da internet, como Google, Facebook, IBM e Microsoft, a rotina dos internautas na rede é uma fonte imprescindível de informação e, consequentemente, de lucro. O que torna o conceito de privacidade na web tão antiquado quanto um disquete de 3,5 polegadas.
Vigilância
Desde a criação do Gmail, por exemplo, servidores do Google monitoram o conteúdo dos e-mails disparados pelos usuários, tanto para evitar spams quanto para direcionar ao internauta a publicidade que mais atende às suas necessidades – tática adotada por dezenas de outros provedores. Por isso, não é surpresa que aquele produto que você namorou antes em vídeos no You Tube e comentou com os amigos surja em um anúncio na sua caixa de e-mails a um preço camarada. Na internet, não existem coincidências.
“É ilusão achar que vivemos num mundo moderno onde há alguma privacidade. Não há mais como fugir. Este monitoramento ocorre desde sempre. A questão é que hoje o usuário da internet deixa rastros mais visíveis”, afirma Marlon Souza, diretor da Morphy, agência especializada em tecnologia digital.
A constatação, compartilhada por outros especialistas, é tratada de forma ambígua pelos próprios internautas. Pesquisa feita com usuários de todo o mundo pela consultoria britânica Economist Intelligence Unit revela que consumidores de serviços como o Google e o Facebook não sabem como seus dados pessoais são usados e reconhecem que a proteção a essas informações é fraca – o que não impede, por outro lado, que continuem fornecendo via internet todo tipo de dado, de hábitos de compras a endereço e fotos pessoais. “No mundo real, ainda estamos longe da violação pessoal retratada em 1984 [livro de George Orwell que mostra uma sociedade constantemente monitorada], mas a privacidade individual está cada vez mais em risco”, sentencia o estudo.
201 horas
...é o tempo, em média, que um norte-americano levaria para ler todas as políticas de privacidade dos sites que visita durante um ano, conforme estudo da Carnegie Mellon University, sediada no estado da Pensilvânia (EUA). Segundo a pesquisa, esse tempo seria o equivalente a cinco semanas de trabalho e, assim, custaria US$ 3,5 mil a cada usuário de internet – o que mostra a ineficiência deste tipo de comunicado junto aos internautas.
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