A redatora publicitária Bruna Castro (à direita) aluga o quarto extra do seu apartamento a viajantes estrangeiros. Até dezembro, a dona da vaga é a alemã Nadja Altpeter
Quando precisar, fica aqui em casa!
Brasileiros descobrem o aluguel de quartos por temporada como uma fonte alternativa de renda
A hospitalidade do brasileiro ganha novos contornos com os sites especializados em aluguel de quartos por temporada. O convite informal do “quando precisar, fica aqui em casa” agora pode ser uma fonte de renda alternativa para quem tem cômodos extras e disponibilidade para receber estranhos.
O modelo de hospedagem, semelhante ao abrigo de parentes e amigos que chegam à cidade ou às antigas pensões familiares, ganha adeptos no Brasil, tanto no número de usuários como no de anúncios de residências disponíveis. O site Airbnb, o maior do segmento no mundo, viu a oferta brasileira aumentar quatro vezes entre 2011 e 2013. Em Curitiba, a quantidade de anúncios no Airbnb foi multiplicada por oito no mesmo período. Hoje, o país tem 12 mil lugares disponíveis para locação pelo site, entre imóveis inteiros e quartos avulsos. Em Curitiba, são 137.
Críticas
Atividade não é bem vista pela hotelaria tradicional
A proposta de oferecer hospedagem em casa de família está apoiada na experiência de o viajante interagir com moradores locais e enriquecer a visita ao destino turístico, além de pagar menos por uma acomodação do que na rede hoteleira convencional.
Mas a prática não é bem vista por entidades que representam a hotelaria convencional. AAssociação Brasileira da Indústria de Hotéis do Paraná (ABIH-PR) classifica a hospedagem doméstica como clandestina. “A rede tradicional recolhe impostos e é submetida a fiscalizações de toda ordem para garantir segurança e qualidade. Em caso de incêndio em uma casa dessas ou de intoxicação alimentar, quem será responsabilizado?”, questiona o presidente da entidade, Henrique Lenz César Filho.
Outro segmento que considera a hospedagem doméstica informal uma ameaça é o de hostels e albergues. As entidades que reúnem esses estabelecimentos avaliam os mercados onde a modalidade cresceu nos últimos anos, comoEstados Unidos e Canadá. Na América Latina, a ameaça é maior para os hostels com até 40 leitos, principalmente nas capitais. “Em dois anos esse tipo de hospedagem vai crescer muito. E a tendência é repetir o cenário de outros continentes, em que as cadeias econômicas foram as mais afetadas”, explica Carla Sottomaior, presidente da Associação de Hostels do Estado do Paraná.
A redatora publicitária Bruna Castro, de 25 anos, sempre curtiu dividir sua casa com viajantes. Há três anos os recebe para curtas temporadas, tanto na camaradagem como na sublocação. Além de anunciar o quarto no Airbnb há um ano e meio, ela também faz parte da rede Couchsurfing, que oferece hospedagem gratuita entre os usuários. No Airbnb, a diária do quarto do seu apartamento, localizado no Alto da XV, custa em média R$ 70. E a taxa de ocupação é de um hóspede por mês.
Até dezembro, a vaga é da estudante alemã Nadja Altpeter. A renda do aluguel cobre 60% da prestação do apartamento. “Além da grana extra, tenho a oportunidade de viajar sem sair de casa. O intercâmbio é total: idioma, gastronomia, cultura e comportamento”, diz.
Mais que um ambiente adequado para oferecer aos hóspedes, Bruna lembra que a personalidade do anfitrião também precisa ser levada em conta: “Gosto de conviver com gente nova, diferente. É preciso estar disposto a receber e orientar o visitante”. A locação também trouxe transformações pessoais. “Você aprende a compartilhar tudo. Me tornei menos egoísta”, diz.
Mas o rendimento extra ainda é o principal estimulo à adesão ao aluguel por temporada. Em um levantamento no Easyquarto, outro site especializado, com 32 mil usuários no Brasil, 90% dos anfitriões brasileiros declararam que a questão financeira é fundamental na hora de decidir abrir a casa aos viajantes. A média mensal registrada em abril e maio deste ano foi de R$ 650, o que equivale a R$ 7,8 mil por ano.
Os grandes eventos internacionais no Brasil devem estimular ainda mais adesão ao modelo. A redatora Bruna Castro já recebeu duas consultas para o período. Pretende manter a casa dela aberta e incentivar amigos a fazer o mesmo. “Convenci dois vizinhos a entrarem no Airbnb e eles estão bem satisfeitos”, conta.
Sites investem para atender à demanda
A Copa de 2014 será o marco da expansão de outro site especializado no segmento. O Cama e Café, criado no Rio de Janeiro em 2003, vai abrir vagas para hospedagem em residências nas 12 cidades-sede do campeonato para atender a demanda. A empresa investiu R$ 350 mil em um projeto de treinamento a distância, para qualificar os anfitriões, e no novo sistema de reservas on-line. Em dez anos, 20 mil pessoas ficaram hospedadas pelo Cama e Café no Rio de Janeiro. Hoje a capacidade do site é de acomodar 300 pessoas ao mesmo tempo. A meta é, em dois anos, atender três mil hóspedes simultaneamente.
A empresa começou a partir da experiência dos sócios fundadores durante uma viagem ao Leste Europeu, em 2000. Adeptos da hospedagem em albergues e casas de família, Carlos Magno Cerqueira Júnior e Leandro Rangel trouxeram para o Brasil a versão nacional do site irlandês Bed&Breakfast. “A hospedagem em casas de família é muito comum fora do país. E aqui também está crescendo. Antes, menos de 10% dos nossos hóspedes eram brasileiros. Agora são quase 25%”, conta Cerqueira Júnior.
O Cama e Café começou com oferta de vagas em Santa Tereza, bairro descolado da capital fluminense, com hospedagem barata e alternativa para estrangeiros que circulavam na região.
O site seleciona os anfitriões candidatos e ajuda a estabelecer valores de diárias e o calendário de reservas. “É importante ser hospitaleiro e ter uma casa bacana para compartilhar”, explica. Em contrapartida, o anfitrião recebe 75% do valor cobrado nas diárias. “Fazemos o repasse depois de descontar tributos, taxa de administração e os encargos, que ficam por nossa conta”, explica Cerqueira Júnior. A empresa tem faturamento anual de R$ 1 milhão.
No Airbnb, os anúncios são gratuitos e o site gera renda pela porcentagem cobrada na reserva: 3% do anfitrião e entre 6% e 12% do hóspede. São 300 mil anúncios em 192 países. Os Estados Unidos – país-sede da empresa – têm a maior oferta, seguidos por França, Itália, Espanha, Alemanha, Reino Unido, Canadá e Brasil. Mais de 4 milhões de pessoas já se hospedaram por meio do Airbnb desde seu início, em 2008 – 3 milhões só no ano passado.
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